A festa se prepara para começar, contando com a euforia de milhões de pessoas, prontas para cair, literalmente - na farra e, mais uma vez, tentar esquecer os problemas, ” porque ninguém é de ferro!”. O carnaval é um período meio enigmático pois trata-se de um feriado prolongado onde grande parte da população “pede licença” para transgredir as suas próprias regras de normalidade, cometer excessos, se transformar em personagens caricatos e propensos a pequenas loucuras. Digo “pequenas” enquadrando a parcela da população que conserva um pouco do juízo funcionando e se excede apenas o suficiente para se olhar no espelho na quarta feira de cinzas sem se envergonhar por completo.
Na realidade mesmo, esse exagero que ocorre no carnaval, reflete um pouco a falta de equilíbrio que existe no Brasil, onde acostumou-se a conviver com crimes, insegurança, desemprego e impunidade. Trata-se de algo crônico e que vem se prolongando por anos a fio. Quanto mais em crise estamos, mais sucesso faz o carnaval.E que ninguém se iluda com isso. Afinal de contas, que outro País consegue ‘apagar’ todos os seus problemas de forma instantânea, durante quatro dias? Pára tudo!! É como se alguém tirasse o Brasil da tomada, desligando-o durante quatro dias. Não se fala em crise, bancos fecham as portas, o comércio dá um tempo, as escolas não funcionam e etc. Somente os hospitais permanecem abertos ( as delegacias também).
Quem lucra mesmo com o carnaval, além das fábricas de bebida alcoólica e cigarros - que são consumidos “às pampas”- são as grandes redes de televisão, as escolas de samba, os grupos de música, os bares e botecos de esquina.
A festa toda deixou o seu caráter cultural de lado há muito tempo e virou um grande circo que movimenta milhões de reais à custa dos excessos do povo. Falando em cultura popular, há alguns dias eu ouvi dois repentistas nordestinos, traduzindo o carnaval de forma interessante, em uma linguagem cabocla, forte e genial que merece ser transcrita aqui:
* ”Carnaval não tem limite nem controle nem fronteira,
tem a sexta-feira gorda, o sábado de zé pereira,
domingo segunda e terça e ressaca na quarta feira.
O clube é superlotado, a praia é abarrotada,
a avenida não cabe, a praça é contaminada
de tanto corpo bonito e tanta cabeça sem nada.
A massa é feito boiada, sem objetividade,
ensaiando personagens imitando a liberdade,
camuflando o sacrifício e driblando a realidade.
Desfiles são exibidos, droga injetada na veia.
Igrejas ficam vazias, boates trabalham cheias,
sobram brigas nas calçadas faltam vagas nas cadeias.
Cerveja, uísque e cachaça, cocaína, crack e cola,
venda de entorpecente, uso ilegal de pistola
são recheios do cardápio da geração coca-cola.
A música que a banda toca e o som que um grupo produz,
não rompe todas barreiras nem quebram todos tabus,
quando os corações são puros as almas são de Jesus… *
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