Uol entrevista Dado Villa-Lobos, sobre o cinqüentenário de Renato Russo:
Dado Villa-Lobos era adolescente quando viu Renato Russo pela primeira vez, em um show da primeira banda do cantor, o Aborto Elétrico, em uma lanchonete de Brasília, no início da década de 80.
A amizade surgida entre os dois jovens moradores da capital federal logo se tornaria parceria musical, quando em 1983 Renato convidou Dado para ser o guitarrista de sua banda nova, a Legião Urbana, que tinha Marcelo Bonfá na bateria. A partir daí, o grupo seria um dos maiores nomes do rock brasileiro, mesmo após a separação em 1996.
Dado Villa-Lobos era adolescente quando viu Renato Russo pela primeira vez, em um show da primeira banda do cantor, o Aborto Elétrico, em uma lanchonete de Brasília, no início da década de 80.
A amizade surgida entre os dois jovens moradores da capital federal logo se tornaria parceria musical, quando em 1983 Renato convidou Dado para ser o guitarrista de sua banda nova, a Legião Urbana, que tinha Marcelo Bonfá na bateria. A partir daí, o grupo seria um dos maiores nomes do rock brasileiro, mesmo após a separação em 1996.
O músico está prestes a lançar seu primeiro álbum solo de estúdio, "Jardim de Cactus", que tem a participação de nomes como Toni Platão, Fausto Fawcet, Paula Toller e Chico Buarque. Em entrevista ao UOL, Dado relembra a amizade com Renato --que faria 50 anos neste sábado (27)--, a história da Legião Urbana e diz que o cantor "deixa saudades e faz uma falta tremenda".
UOL - Como você vê o cinquentenário do Renato?Villa-Lobos - Ele era realmente mais velho (risos)! Tinha cinco anos a mais do que eu. Vejo como um irmão mais velho que se foi, que deixa saudades e faz uma falta tremenda. É uma história que não se resolveu.
UOL - Como foi que você o conheceu?
Villa-Lobos - Vi ele tocando com o Aborto Elétrico. Acho que era uma tarde de sexta-feira ou sábado, numa lanchonete chamada Foods, ali na beira do Eixinho. Era na 111, e eu morava na 213, o que quer dizer que eu tive que andar uns 500 metros numa diagonal para ver a banda tocando. E foi impressionante. Foi a primeira vez em que eu estive perto do Renato, me lembro que ele estava empunhando uma guitarra Gianini modelo Les Paul preta.A empatia foi imediata. Você pensa "opa, o que está acontecendo aqui??" e de repente passa a fazer parte daquilo. A identificação foi tanta que eu grudei neles como um satélite. Ver o Aborto, ver o Renato, naquela ambiência, naquele lugar, num fim de tarde, foi uma coisa que me marcou muito, que mudou minha vida para sempre.Brasília é um lugar ímpar na face da terra. Naquele tempo a cidade só tinha 20 anos e ainda tinha muita coisa a ser descoberta por nós, era um lugar diferente de qualquer outro por onde eu havia passado até então, com essa característica louca naquele momento de mobilizar as pessoas. E foi assim, as oportunidades foram aparecendo naquele ambiente quase surreal.
UOL - Você já sentia desde o começo que ele era uma pessoa carismática, destinada a algo maior?
Villa-Lobos - Ainda não existia essa questão das "coisas maiores". Nosso universo era o de uma turma adolescente que morava em Brasília, um lugar no interiorzão do Brasil, longe do eixo cultural do país. Mas era visível que o Renato era uma pessoa especialíssima, que agregava as pessoas e mobilizava geral, com um olhar cintilante. O Renato sempre foi essa figura hipnotizante, carismática e muito querida.
UOL - Você ficou surpreso quando foi chamado para entrar na Legião?
Villa-Lobos - Falei "pô, que bacana", mas não tinha esse peso todo ainda. Era só um grupo com dois caras que estavam precisando de um guitarrista porque o outro tinha ido embora. Eu tinha acabado de passar no vestibular para a UNB e foi tipo ?oba, legal, vamos matar o tempo fazendo coisas bacanas?.
Foi meio em cima da hora, porque ia ter um show num festival um mês depois. O grupo estava começando ali e ainda não tinha repertório. Foi durante esse mês que a gente fez um monte de músicas juntos e percebemos que algo estava acontecendo ali. Mas na hora eu só disse ?sei lá... vamo nessa?.
Foi meio em cima da hora, porque ia ter um show num festival um mês depois. O grupo estava começando ali e ainda não tinha repertório. Foi durante esse mês que a gente fez um monte de músicas juntos e percebemos que algo estava acontecendo ali. Mas na hora eu só disse ?sei lá... vamo nessa?.
UOL - A partir do ?Dois? vocês tiveram aquela escalada meteórica chegando a lotar estádios de futebol, o que era raro para bandas de rock nacional. Como isso mexeu com as cabeças de vocês e do Renato em particular, que era uma pessoa tão sensível e intensa?
Villa-Lobos - O Renato nesse momento já tinha uma personalidade oscilante. Acho que hoje chamam de bipolar, essa coisa de estar na euforia e logo depois triste, deprimido. Isso era diretamente influenciado pela vida que a gente estava vivendo ali. Mas apesar de tudo a gente sempre se preservou.Foi mais ou menos nessa época que aconteceu aquele incidente no estádio Mané Garrincha em Brasília (em 1988, um show da banda terminou com brigas na plateia e troca de insultos entre banda e público). A gente remediou da melhor forma possível e se recolheu até fazer o As Quatro Estações. Também aproveitamos para fazer cada um suas próprias coisas, sem ficar tão dependente do conjunto.Mas no final acho que a gente se saiu muito bem.
UOL - O incidente no estádio ajudou vocês a cortar o cordão umbilical com a cidade? A partir daí vocês deixaram de ser uma banda de Brasília?Villa-Lobos - Sem dúvida. Sobrou uma mágoa gigante. Nunca mais voltamos. Mas o cordão umbilical já estava cortado. Da minha parte, eu não tinha mais parentes lá, tinha grandes amigos que morreram estupidamente no trânsito... tinha poucas relações em Brasília. Mas o Renato tinha os pais morando lá ainda e ficou puto. Falou “aqui eu não volto mais”. E acho que não voltou mesmo.
UOL - Essa intensidade da fama ajudou o Renato a perder o controle?Villa-Lobos - Com certeza! Se ao invés de ter realizado o sonho de ser um rock star absoluto ele tivesse seguido carreira no ministério da agricultura, no Codecon ou no Banco do Brasil, ele talvez não tivesse tido toda essa intensidade de adrenalina e emoções. Mas acho que ele jamais teria sido outra coisa além do que ele foi.
UOL - Como a relação de vocês como amigos mudou no decorrer da carreira?Villa-Lobos - Eu era muito jovem, tinha 17, 18 anos... fomos aprendendo a se conhecer e se relacionar, a ter obrigações, direitos e deveres, as fronteiras da convivência e da amizade. Uma coisa que jamais faltou foi respeito um pelo outro. Acho que era uma coisa mútua que fez com que tudo acontecesse de uma forma bacana.
UOL - Vocês tinham personalidades bem distintas. Isso equilibrava a dinâmica da banda?Villa-Lobos - Sem dúvida. O Bonfá é um aquariano, que parece que está totalmente aéreo mas com uma sensibilidade musical muito grande. O Renato por mais louco, bipolar, fora de controle que pudesse estar, jamais foi incoerente com si mesmo, com os outros e com a vida. Ele deixava bem claro quem ele era. E eu ia segurando as pontas da banda, arrumava advogado, empresário e além disso tudo ainda tinha que estar no estúdio ensaiando e fazendo as músicas.
UOL - Que rumos vocês acham que teriam tomado artisticamente se ele ainda estivesse vivo?
Villa-Lobos - Não sei se o grupo ainda existiria, mas se fosse o caso estaríamos fazendo o que sempre fizemos de melhor, que era a música. Aquele trio quando se juntava era muito bom para fazer, produzir e compor música. Acho que ainda estaríamos fazendo isso, mas ainda com cada um na sua.A Legião urbana continua até hoje como uma entidade quase eterna, da qual a gente, já na época, não tinha o controle. Já era de todos.
UOL - Que recado você gostaria de deixar para os fãs no aniversário do Renato?
Villa-Lobos - A mensagem é essa que está aí e foi transmitida tantas e tantas vezes pelo próprio Renato e pela banda: o amor vence qualquer destruição e estupidez e que as pessoas pensem mais nesse sentido.
Nenhum comentário:
Postar um comentário