Bem, não se pode negar que ele teve tempo para preparar Zé Ramalho canta Bob Dylan – Tá tudo mudando (o nome que a canção Things have changed ganhou). Lançado há pouco, o álbum vai estrear no palco em 20 de março, quando a turnê terá início em São Paulo.A paixão por Dylan remonta à juventude de Ramalho, quando ele ouviu pela primeira vez, em João Pessoa, Don’t think twice, it’s all right. De lá pra cá veio fazendo suas tentativas. A primeira é de 1992, quando Hurricane se tornou Frevoador no álbum homônimo.
Mais conhecida tornou-se sua Batendo na porta do céu (de Knockin’ on heaven’s door, que ganhou gravação mais acelerada no novo álbum), registrada seis anos mais tarde. Ambas as canções estão na versão em DVD do disco, que tem três faixas a mais do que o CD. “Tive que mergulhar profundamente no universo dyliano para absorver as emoções e mensagens que estão contidas nas letras”, assume Ramalho.
Tanto por isso, ele preferiu manter, na maior parte, uma tradução quase literal, “para não perder o sentido filosófico e poético”.Mesmo assim, permitiu-se algumas liberdades. Blowin’ in the wind (ao pé da letra, soprando no vento) virou O vento vai responder; Mr. Tambourine Man agora é Mr. do Pandeiro, com direito a citação de Jackson do Pandeiro, outra influência recorrente na obra de Ramalho. A sonoridade, obviamente, também foi abrasileirada.
Em comum, Dylan e Ramalho têm a recriação da música “de raiz” (no caso do norte-americano, o folk; no brasileiro, os ritmos nordestinos). Ainda são adeptos do chamado canto falado (ainda que a voz de Dylan esteja cada vez mais anasalada e a de Ramalho mantenha os graves no lugar). A faixa-título tem um pé no brega, enquanto Não pense duas vezes, tá tudo bem (Don’t think twice, it’s all right, a preferida de Ramalho, tanto na gravação original quanto em sua própria versão) ganhou um acento sertanejo.
“As adaptações dos ritmos brasileiros/nordestinos são totalmente da minha competência e habilidade. Com esses elementos, consegui dar uma identidade própria, isto é, personalizar a música brasileira”, afirma. Dylan em ritmo de xote é, definitivamente, uma ousadia. Mas se há um cantor e compositor no Brasil que tem o direito de fazer isso, esse alguém é Zé Ramalho.
“Não tenho expectativa de receber algum comentário dele” Sua história com Dylan é antiga, tanto que já havia feito versões anteriormente.
Quando ouviu Dylan pela primeira vez?
Foi no fim dos anos 1960, em João Pessoa, na Paraíba. Acho que a primeira música que escutei foi Don’t think twice, it’s all right, música que era sucesso mundial naquela época. Achei curiosa a canção e procurei me inteirar mais da obra daquele artista, buscando os discos que estavam disponíveis nas lojas. Consegui comprar uma compilação de vários sucessos do Dylan, onde músicas como It’s all over now, baby blue e Blowin’ in the wind me fizeram a cabeça. Eu estava então com 19 anos.
Por que fazer versões para clássicos de Dylan, e não canções menos conhecidas?
Esse é um projeto sem precedentes no Brasil e versar os clássicos de Dylan foi, a meu ver, o portal inicial para realizar esse trabalho. Como a obra dele é muito vasta, as músicas menos conhecidas não causariam o mesmo impacto que os clássicos. Há alguns anos Seu Jorge lançou um álbum só com versões de David Bowie. O encarte trazia inclusive uma frase de Bowie elogiando o trabalho.
Você tem a intenção de mandar o álbum para Dylan?
A própria gravadora EMI se encarregará de mandar CD e DVD para os assessores de Dylan. Isso ocorrerá naturalmente, até porque os próprios assessores pediram que o material fosse remetido a ele. Mas não tenho absolutamente nenhuma expectativa nem ansiedade de receber algum comentário dele.
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