"Nenhuma outra seleção desta Copa do Mundo se parece tanto com o Brasil campeão de 1994 quanto a Holanda de Arjen Robben e Wesley Sneijder, pragmaticamente dirigida por Bert Van Marwijk.
Claro que Robin Van Persie, embora se ache, não é Romário, mas Sneijder está jogando muito mais do que Raí e/ou Mazinho naqueles tempos e Robben rodopia menos, mas resolve mais do que aquele Zinho.
Não são os craques de uma e outra, porém, que fazem esta Holanda de Van Marwijk se parecer com aquele Brasil de Carlos Alberto Parreira. O que une as duas equipes, mais do que a distribuição dos jogadores em campo, é a atitude consciente do primeiro ao último minuto de jogo.
A Holanda é um time que está na África do Sul para ganhar a Copa, de jogo em jogo, pacientemente, sem a volúpia ofensiva de outras épocas. Aquele futebol vistoso, alegre, às vezes até irresponsável, da Laranja Mecânica e sucessoras menos talentosas não faz a cabeça desta seleção que mantém os pés no chão mesmo depois dos extraordinários resultados dos últimos tempos.
À fantasia sobrepõem-se os resultados.
São resultados de meter medo em qualquer adversário : 100% de aproveitamento na Copa, com quatro vitórias em quatro jogos, e 100% de aproveitamento nas eliminatórias, com oito vitórias em oito jogos. A Holanda não sabe o que é perder há 23 jogos.
O problema, para eles, é que o Brasil não se amedronta facilmente. Pelo contrário, como mancheteou o jornal espanhol AS após os 3 a 0 no Chile : "O Brasil dá medo". Van Marwijk sabe que é verdade e inveja o Brasil :
- O Brasil representa um enorme desafio para nós. É uma equipe muito madura e sólida, que transmite uma forma positiva de arrogância, é quase como se fosse invencível. Falta esse sentimento ao nosso time. Pela primeira vez em uma partida desta Copa, a Holanda não será favorita.
O próprio Van Marwijk acha que falta à sua equipe a "forma positiva de arrogância" que seria marca registrada do Brasil. A história do futebol e, em especial, a história das Copas explica por que sobra ao Brasil o que falta à Holanda. É só conferir a lista e os resultados das finais das Copas para entender a diferença.
Esqueça-se a história, no entanto, pois jamais se viu em campo uma Holanda como esta que o Brasil vai enfrentar nesta sexta-feira, dia 2, no Estádio Nelson Mandela. É um time que se dá bem com a bola e procura mantê-la aos pés, mas nunca se afoba nem se deslumbra com a vantagem no marcador. Faz o que é preciso para vencer, sem se descuidar da defesa. É um time equilibrado em todas as linhas, sonho de todo treinador.
Até chegar às quartas de final, a Holanda de Van Marwijk tem mostrado uma pulsação mais cadenciada do que o Brasil um tanto inconstante de Dunga. Para o bem e para o mal, o Brasil é mais febril. Mais nervosinho, talvez. Certamente, mais sujeito aos humores da Jabulani. Em compensação, o Brasil é muito mais mortal. E sexta é dia de matar ou morrer.
Há situações específicas do jogo que devem preocupar o técnico brasileiro - o embate direto entre Robben e Michel Bastos, por exemplo. O holandês não é Garrincha, mas o nosso lateral é a mais completa reencarnação dos Joões que faziam a alegria do mais espetacular ponta direita de todos os tempos. Alguém tem de ajudar Michel Bastos em Port Elizabeth.
O Brasil precisa também vigiar Mark Van Bommel, um volante experiente que tem sofrido muitas faltas e cometido poucas, enxerga bem o jogo e faz com qualidade a passagem de bola da defesa para o ataque da Holanda. Marcar Van Bommel é deixar na orfandade o talentoso Sneijder.
Fechando os caminhos para Van Bommel, pelo meio, e Robben, pela ponta, o Brasil de Kaká, Robinho e companhia fará da Holanda sua próxima vítima.
Afinal, até o comandante Bert Van Marwijk sabe muito bem que, em Copa do Mundo, a Holanda nada, nada, nada e acaba morrendo na praia. Não deve ser diferente em Port Elizabeth, bela cidade à beira do oceano Índico.
PS: Infelizmente, Elano continuará desfalcando a Seleção. É uma grande perda, principalmente porque Daniel Alves tem sido mais afoito do que eficiente, preocupado demais em chutar a gol, e o modelo Dunga para as ações ofensivas depende, em boa parte, da movimentação de Elano e Robinho.
No futebol, ensinava Gentil Cardoso, "quem pede, tem preferência ; quem se desloca, recebe". Elano se desloca, Daniel Alves pede a bola. Quando o adversário reduz os espaços, Elano ajuda, mas Daniel Alves complica a vida de Robinho e Kaká."
Por Roberto Benevides, jornalista, cearense radicado em SP e RJ, foi editor dos matutinos JB, O Estado de S. Paulo, Folha de S.Paulo, e dos hebdomadários Veja, Exame e Época. No Estadão, foi por muitos anos o editor de seu caderno de esportes. Atualmente, gerencia a área de informação da Traffic Sports.
Nenhum comentário:
Postar um comentário